As minhas duas mulheres especiais
Há uns vinte anos atrás, a minha vida e minha saúde começaram a modificar-se por via de uma doença neuromuscular, que aos pouco se foi apoderando de meus músculos reduzindo-os a simples e pequenas massas sem préstimo algum, condicionando o meu andar e movimentos normais de qualquer ser humano. Lentamente fui perdendo, primeiro, a capacidade de levantar as pontas dos pés, fazendo agravar aquilo que tecnicamente se define como pé pendente, e depois, os quadricípedes foram-se tornando massas de gordura e perdendo a tonicidade habitual, até que o andar só era possível pelo apoio de bengalas ou de vulgares canadianas.
Os sucessivos exames médicos não foram conclusivos, e ora se procurava por uma causa, pesquisando nos sistemas e ramais nervosos da coluna, ou fazendo sucessivas biopsias a que me sujeitei, por forma a retirar pequenas porções de músculo e nervo, que observadas microscópicamente pelos entendidos, e à luz dos conhecimentos então existentes, acabaram por arranjar causas em hipóteses pouco credíveis.
A verdade é que nada se concluindo de forma evidente e científica, restava tentar diminuir os impactos, promovendo o uso de fisioterapeutas e suas técnicas, mas tentando evitar exageros de tratamento, porque poderia estar em causa um aumento das progressão dos males, evitando o desgaste dos poucos músculos existentes.
E o tempo foi decorrendo com sessões que não fizeram nada de novo, nem mesmo no campo funcional. E a minha qualidade de vida foi drasticamente reduzida e meus horizontes temporais cada vez mais complicados e inatingíveis.
Assim se passaram dez anos em que nada se alterou no campo da doença, da sua identificação concreta, e do conhecimento médico sobre ela. Mas a ciência nesta área se desenvolveu mais nestes últimos dez anos que em quase nos últimos cinquenta, e em especial no campo da medicina, passaram a ser desvendados segredos e mistérios, que permitiram o conhecimento exacto de situações que antes estavam catalogadas e misturadas com muitas outras semelhantes.
É o caso de distrofias que são tantas, semelhantes, e com o mesmo resultado nos doentes – a degradação neuromuscular - e no fim se vão acabando por revelar com origens diferentes. Muitas destas doenças foram identificadas, umas conseguindo ter cura mas outras ainda, as genéticas, sabendo-se onde se encontra o “erro” genético, mas sem possibilidades de as resolver.
E foi assim que há cinco anos eu acabei sabendo que minha doença já catalogada e identificada se trata da redução ou inexistência de uma proteína da membrana celular, denominada “dysferlin”, e que foi identificada em finais de 1999. E assim passei a ser dono de uma maleita com nome, o que nada mais acrescentou à sua necessária cura, já que é uma doença órfã... Órfã porque existindo tão poucos doentes, os laboratórios não se preocupam muito com a pesquisa de tratamentos, pois o retorno do investimento não é assegurado.
Mas muito recentemente, ao tomar conhecimento de que existem vários graus de severidade da doença, em função da quantidade de disferlina existente, acabei relacionando isto com o facto de continuar a manter força muscular nos membros superiores, e de durante quase quarenta anos ter mantido uma massa muscular adequada à minha estatura, e que só depois de uma imobilização forçada de três meses, em que as massas musculares se tinha reduzido, a doença cavalgou e se instalou gradativamente.
Ora, portanto, nada impedia que se fosse efectuada uma correcta acção de recuperação muscular, os resultados se poderiam começar a sentir em alguns meses, se o nível de severidade de minha doença fosse reduzido, o que se desconhecia
E assim, voltei a fazer fisioterapia, apoiado por uma terapeuta de nova geração, profissional de qualificado conhecimento, e em pouco mais de dois meses nos apercebemos de que algo estava mudando nos movimentos e o crescimento de massas musculares se havia iniciado. É indescritível a satisfação que obtive, e a perspectivação de melhoras passaram a fazer parte do meu horizonte.
E se o meu empenho nos tratamentos, foi importante, não devo deixar de reconhecer a competência profissional da terapeuta Joana, que procurou resolver alguns bloqueamentos funcionais e que acabaram por resolver a qualidade de minha marcha. Era evidente que algo de importante estava a acontecer. Mas a fisioterapia por si só não era a única forma de providenciar recuperação, já que alguns aspectos relacionados com amplitudes de movimentos, e mesmo de esforço necessário, aconselhavam que me socorresse da hidroterapia, onde os movimentos são mais fáceis de executar e o nosso peso diminui de forma significativamente, permitindo esforços de maior performance, sem existência de cansaço.
São demais conhecidos os benefícios da natação, mas para mim constituiu novidade a quantidade de exercícios de musculação e movimentação possíveis de realizar. Escolhi as aulas de Hidroterapia das Piscinas do Estádio Nacional, onde encontrei uma profissional de valor e dedicação, que me conseguiu transmitir alegria e energia. A minha amiga licenciada em motricidade, de seu nome Mónica, foi a responsável por parte do meu êxito.
E assim a Joana e a Mónica são as mulheres que ocupam o centro de minha existência, e tornando-se cúmplices de uma recuperação provável e previsível. A elas o devo poder visualizar a luz no fundo do túnel das dificuldades, ao mesmo tempo que o meu ego começa crescendo, e de uma forma expressiva me faz renascer de esperança e de confiança. A ambas a minha profunda gratidão.
E todo este trabalho vai prosseguir pois com ele foi possível que iniciasse trabalhos de musculação, em máquinas comuns de ginásio, e que antes meus músculos não suportariam. Agora, tudo se encaminha para que em mais uns meses de trabalho se retorne a vinte anos atrás quando eu era um jovem cheio de força e vontade de viver.
O renascer está acontecendo.
Educunha
04Jan2006
Os sucessivos exames médicos não foram conclusivos, e ora se procurava por uma causa, pesquisando nos sistemas e ramais nervosos da coluna, ou fazendo sucessivas biopsias a que me sujeitei, por forma a retirar pequenas porções de músculo e nervo, que observadas microscópicamente pelos entendidos, e à luz dos conhecimentos então existentes, acabaram por arranjar causas em hipóteses pouco credíveis.
A verdade é que nada se concluindo de forma evidente e científica, restava tentar diminuir os impactos, promovendo o uso de fisioterapeutas e suas técnicas, mas tentando evitar exageros de tratamento, porque poderia estar em causa um aumento das progressão dos males, evitando o desgaste dos poucos músculos existentes.
E o tempo foi decorrendo com sessões que não fizeram nada de novo, nem mesmo no campo funcional. E a minha qualidade de vida foi drasticamente reduzida e meus horizontes temporais cada vez mais complicados e inatingíveis.
Assim se passaram dez anos em que nada se alterou no campo da doença, da sua identificação concreta, e do conhecimento médico sobre ela. Mas a ciência nesta área se desenvolveu mais nestes últimos dez anos que em quase nos últimos cinquenta, e em especial no campo da medicina, passaram a ser desvendados segredos e mistérios, que permitiram o conhecimento exacto de situações que antes estavam catalogadas e misturadas com muitas outras semelhantes.
É o caso de distrofias que são tantas, semelhantes, e com o mesmo resultado nos doentes – a degradação neuromuscular - e no fim se vão acabando por revelar com origens diferentes. Muitas destas doenças foram identificadas, umas conseguindo ter cura mas outras ainda, as genéticas, sabendo-se onde se encontra o “erro” genético, mas sem possibilidades de as resolver.
E foi assim que há cinco anos eu acabei sabendo que minha doença já catalogada e identificada se trata da redução ou inexistência de uma proteína da membrana celular, denominada “dysferlin”, e que foi identificada em finais de 1999. E assim passei a ser dono de uma maleita com nome, o que nada mais acrescentou à sua necessária cura, já que é uma doença órfã... Órfã porque existindo tão poucos doentes, os laboratórios não se preocupam muito com a pesquisa de tratamentos, pois o retorno do investimento não é assegurado.
Mas muito recentemente, ao tomar conhecimento de que existem vários graus de severidade da doença, em função da quantidade de disferlina existente, acabei relacionando isto com o facto de continuar a manter força muscular nos membros superiores, e de durante quase quarenta anos ter mantido uma massa muscular adequada à minha estatura, e que só depois de uma imobilização forçada de três meses, em que as massas musculares se tinha reduzido, a doença cavalgou e se instalou gradativamente.
Ora, portanto, nada impedia que se fosse efectuada uma correcta acção de recuperação muscular, os resultados se poderiam começar a sentir em alguns meses, se o nível de severidade de minha doença fosse reduzido, o que se desconhecia
E assim, voltei a fazer fisioterapia, apoiado por uma terapeuta de nova geração, profissional de qualificado conhecimento, e em pouco mais de dois meses nos apercebemos de que algo estava mudando nos movimentos e o crescimento de massas musculares se havia iniciado. É indescritível a satisfação que obtive, e a perspectivação de melhoras passaram a fazer parte do meu horizonte.
E se o meu empenho nos tratamentos, foi importante, não devo deixar de reconhecer a competência profissional da terapeuta Joana, que procurou resolver alguns bloqueamentos funcionais e que acabaram por resolver a qualidade de minha marcha. Era evidente que algo de importante estava a acontecer. Mas a fisioterapia por si só não era a única forma de providenciar recuperação, já que alguns aspectos relacionados com amplitudes de movimentos, e mesmo de esforço necessário, aconselhavam que me socorresse da hidroterapia, onde os movimentos são mais fáceis de executar e o nosso peso diminui de forma significativamente, permitindo esforços de maior performance, sem existência de cansaço.
São demais conhecidos os benefícios da natação, mas para mim constituiu novidade a quantidade de exercícios de musculação e movimentação possíveis de realizar. Escolhi as aulas de Hidroterapia das Piscinas do Estádio Nacional, onde encontrei uma profissional de valor e dedicação, que me conseguiu transmitir alegria e energia. A minha amiga licenciada em motricidade, de seu nome Mónica, foi a responsável por parte do meu êxito.
E assim a Joana e a Mónica são as mulheres que ocupam o centro de minha existência, e tornando-se cúmplices de uma recuperação provável e previsível. A elas o devo poder visualizar a luz no fundo do túnel das dificuldades, ao mesmo tempo que o meu ego começa crescendo, e de uma forma expressiva me faz renascer de esperança e de confiança. A ambas a minha profunda gratidão.
E todo este trabalho vai prosseguir pois com ele foi possível que iniciasse trabalhos de musculação, em máquinas comuns de ginásio, e que antes meus músculos não suportariam. Agora, tudo se encaminha para que em mais uns meses de trabalho se retorne a vinte anos atrás quando eu era um jovem cheio de força e vontade de viver.
O renascer está acontecendo.
Educunha
04Jan2006
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