O Morse do chefe Belchior
Ao lêr Gabriel García Márquez no livro “Memória das minhas putas tristes” diz o autor que "fora durante quarenta anos o inflacionador de telegramas de El Diário de la Paz, que consistia em em reconstruir em prosa indígena as noticias do mundo que apanhávam pelo ar no espaço sideral pelas ondas curtas ou pelo código morse". Esta declaração deste escritor nascido no seio do jornalismo fez-me recordar um episódio passado há mais de cinquenta anos, em Angola, na cidade de Nova Lisboa, hoje Huambo
Nasci no Lubango, no sul de Angola, por capricho de minha mãe que quiz ter o seu primeiro filho, junto e com o apoio dos pais, meus avós, que viviam em Sá da Bandeira, e acabei depois crescendo e vivendo em Nova Lisboa onde fui concebido.
A 17 de Julho de 1950 meu pai faleceu num acidente de aviação, quando um avião DC3 das linhas aéreas de Angola se despenhou na Serra do Bocoio a umas dezenas de quilómetros do Lobito para onde o meu pai se dirigia. Este episódio alterou profundamente a vida de minha mãe, viúva muito jovem, e com dois filhos de muito tenra idade, com um e com três anos. A nossa vida passou por um grande apoio familiar de parte dos meus tios Quinhas e Zé Kamdimba, cedendo à minha mãe, uma pequena casa no rés-do chão no prédio da sua casa, e onde passámos a viver. Sempre teremos esta dívida de gratidão para com estas excelentes pessoas.
Nasci no Lubango, no sul de Angola, por capricho de minha mãe que quiz ter o seu primeiro filho, junto e com o apoio dos pais, meus avós, que viviam em Sá da Bandeira, e acabei depois crescendo e vivendo em Nova Lisboa onde fui concebido.
A 17 de Julho de 1950 meu pai faleceu num acidente de aviação, quando um avião DC3 das linhas aéreas de Angola se despenhou na Serra do Bocoio a umas dezenas de quilómetros do Lobito para onde o meu pai se dirigia. Este episódio alterou profundamente a vida de minha mãe, viúva muito jovem, e com dois filhos de muito tenra idade, com um e com três anos. A nossa vida passou por um grande apoio familiar de parte dos meus tios Quinhas e Zé Kamdimba, cedendo à minha mãe, uma pequena casa no rés-do chão no prédio da sua casa, e onde passámos a viver. Sempre teremos esta dívida de gratidão para com estas excelentes pessoas.
Minha adorada mãe foi então procurar trabalho, concorrendo para os correios e teve de ir à capital, Luanda, tomar posse do lugar de funcionário de correios. Era assim naquele tempo. A descentralização era desconhecida, e tudo estava concentrado e se tratava na capital da colónia. Para se resolver algum assunto lá se teria de pedir ao Tio Agostinho Marques Trindade, que era Engenheiro da Bricom, pessoa muito conhecida em Luanda, uma figura volumosa, com voz tonitroante e com uns olhos grandes, muito amigo de seu amigo, e que acabava sempre conseguir abrir ou ajudar a abrir as portas. E assim, a Lilita, nome familiar de minha mãe, começou vendendo selos e fazendo registos de cartas na velha estação dos correios no jardim da alta. Ali acabou conhecendo um colega de profissão, e três anos passados sobre a morte de meu pai, consorciaram-se e fomos viver para uma outra casa no bairro da Calumanda durante um ano, até que ficasse vaga a casa dos Correios, que o Belchior Mendes, era esse seu nome, tinha direito por entretanto ter sido nomeado chefe da estação dos correios. Na Calumanda nasceu a minha querida irmã Belinha diminuitivo de Anabela.
O nosso padrasto, era chamado por nós de padrinho, e era um excelente radiotelegrafista e naquele tempo as notícias eram recebidas do modo que refere Gabriel García Márquez, letra a letra, descodificando o código morse que era transmitido pela Press Lusitanea a partir de Portugal. E os textos eram batidos à máquina de escrever Remington, em papel especialmente desenhado para o efeito. Levava cerca de uma hora a receber todo o serviço, que depois era disponibilizado ao Jornal do Planalto e ao Rádio Clube do Huambo. Aquela transmissão era feita a horários certos, duas ou três vezes por dia, de modo a permitir que, se existisse qualquer atrazo, ou dificuldade de propagação, o texto integral era recebido.
Eu que tinha na altura os meus sete anos acompanhava estes trabalhos, principalmente aos domingos, quando às sete da manha, o Chefe como era carinhosamente por nós chamado, ia para a estação de telecomunicações dos correios, sintonizava o sinal num enorme receptor da RCA com duas enormes rodas de quadrante com umas escalas em quilociclos – mais tarde vim a saber que se chamavam de VFO – e o sinal jorrava pelos auscultadores.
Anos mais tarde, aí por volta dos meus dezasseis anos colaborava nos serviços técnicos do Rádio Clube de Malange, como operador de técnica, e recebemos uns receptores da marca Hamarlund, para fazer o trabalho de “inflaccionador” de notícias como descreve GGM. E era mesmo verdade, pois muitos acontecimentos eram aumentados na sua dimensão e espectacularidade por forma a gerar mais emoção aos radiouvintes.
E foi aí que o bicho das telecomunicações me começou a “morder”, e ainda hoje, continuo dedicando muito tempo ao amadorismo de rádio. E foi o chefe o responsável.
O nosso padrasto, era chamado por nós de padrinho, e era um excelente radiotelegrafista e naquele tempo as notícias eram recebidas do modo que refere Gabriel García Márquez, letra a letra, descodificando o código morse que era transmitido pela Press Lusitanea a partir de Portugal. E os textos eram batidos à máquina de escrever Remington, em papel especialmente desenhado para o efeito. Levava cerca de uma hora a receber todo o serviço, que depois era disponibilizado ao Jornal do Planalto e ao Rádio Clube do Huambo. Aquela transmissão era feita a horários certos, duas ou três vezes por dia, de modo a permitir que, se existisse qualquer atrazo, ou dificuldade de propagação, o texto integral era recebido.
Eu que tinha na altura os meus sete anos acompanhava estes trabalhos, principalmente aos domingos, quando às sete da manha, o Chefe como era carinhosamente por nós chamado, ia para a estação de telecomunicações dos correios, sintonizava o sinal num enorme receptor da RCA com duas enormes rodas de quadrante com umas escalas em quilociclos – mais tarde vim a saber que se chamavam de VFO – e o sinal jorrava pelos auscultadores.
Anos mais tarde, aí por volta dos meus dezasseis anos colaborava nos serviços técnicos do Rádio Clube de Malange, como operador de técnica, e recebemos uns receptores da marca Hamarlund, para fazer o trabalho de “inflaccionador” de notícias como descreve GGM. E era mesmo verdade, pois muitos acontecimentos eram aumentados na sua dimensão e espectacularidade por forma a gerar mais emoção aos radiouvintes.
E foi aí que o bicho das telecomunicações me começou a “morder”, e ainda hoje, continuo dedicando muito tempo ao amadorismo de rádio. E foi o chefe o responsável.
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